Rabo-de-peixe: a solução!
Gestação normal, acompanhamento médico eficiente, o parto seria na maternidade Nossa Senhora das Graças, aqui em Nova Era-MG.
Todo o enxoval fora confeccionado, com o mesmo carinho de sempre, pela própria Aparecida. As peças dos primeiros dias já se encontravam dentro de uma maleta, a ser levada para a maternidade, no dia em que sucedesse o parto.
O neném deveria chegar na primeira semana do mês de Maio de 1965.
O dia 4 de Maio amanheceu com um sol esplendoroso, num céu azul, sem nuvens. Ao correr da manhã, o movimento de pessoas era intenso na Praça dos Expedicionários, onde residíamos no número 50, desde nosso casamento.
Após um gostoso café com broa de fubá e biscoitos caseiros, saí para o trabalho na agência local dos Correios e Telégrafos, onde exercia a função de telegrafista, recebendo e transmitindo telegramas pelo código Morse, que é assim:
Letra S: . . .
Letra O: - - -
Letra I: . .
Letra E: .
Pronto! Eis minha assinatura em código Morse:
. . . / - - - / . . / .
Antes de chegar aos Correios, uma paradinha a fim de fazer o ponto dos operários na construção do prédio do meu irmão, o Diló, residente em outra cidade (era eu quem gerenciava a obra).
Logo alcancei a agência e iniciei os trabalhos. Quatro horas depois, voltei a minha casa, onde Aparecida e os meninos me esperavam para o almoço, que transcorreu tranqüilamente. Degustamos banana “nanica” assada, com mel, canela e queijo ralado - que delícia de sobremesa!
Aparecida já sentia algumas contrações. Certamente, o bebê haveria de nascer nas próximas horas. Antes de retornar ao trabalho, combinamos que ela pediria a alguém que me chamasse, caso fosse necessário.
No meio da tarde, eis que surge o filho Jaques:
- Mamãe está chamando, papai!
Cinco longos minutos foi o tempo gasto para encerrar as transmissões. Comecei a ficar aflito.
Corri pra casa, onde encontro Aparecida ofegante, dizendo que chegara a hora. Não havia tempo a perder!
Como nós não possuíamos automóvel, corri à procura de um táxi, mas não havia nenhum no ponto. Eu já estava ficando apavorado, ansioso e desorientado quando surgiu o amigo Sérgio Loteria com o seu longo Chevrolet Belair 58, rabo-de-peixe.
Sinalizei para que parasse, rapidamente expus a situação e solicitei ajuda. Sem nada dizer, mandou-me entrar e tocou para minha residência.
Desci, entrei em casa, chamei minha mulher, peguei a maleta com as roupinhas e caminhamos juntos até à porta. Ao se deparar com aquele “carrão”, Aparecida perguntou-me:
- Onde está o táxi, Ismael?
Disse-lhe não haver nenhum táxi disponível e que o amigo Sérgio nos conduziria à maternidade.
Aparecida pôs-se a chorar:
- Nesse carro chique? Não é possível!
Expliquei-lhe que não havia táxi no ponto:
- Não percamos tempo! Entre e vamos embora!
Em instantes chegamos e Aparecida foi imediatamente conduzida à sala de partos. Agradeci, emocionado, ao Sérgio. Entrei e fiquei, como todo pai, muito ansioso ali na Sala de Espera, próximo ao bloco cirúrgico.
Não demorou muito e a enfermeira abriu a porta:
- Senhor Ismael, venha ver o menino forte, perfeito e sadio que vocês ganharam!
Abracei Aparecida, agradecemos a DEUS pelo final feliz e abençoamos o nosso oitavo filho, o Nélio Costa. Deixei-a confortavelmente instalada no apartamento, enquanto o Nélio recebia os cuidados rotineiros no berçário.
Para comunicar o nascimento a nossos familiares, dirigi-me ao telefone público, na parte externa.
Qual não foi minha surpresa ao encontrar o Sergio em seu Belair! O carro, tão comprido, se encontrava imobilizado num desnível na saída do estacionamento! Era engraçado, mas eu não podia rir dele...
O menino já tinha nascido e ele, ali, naquele “navio” encalhado!
Comuniquei-lhe o nascimento do menino e sugeri que deixasse o carro em ponto morto, saísse do mesmo e o empurrássemos para um ponto mais nivelado.
Foi o que fizemos e meu amigo, finalmente, tomou seu rumo. Contei para Aparecida o ocorrido e rimos demais da situação.
Aquele menino, hoje, trabalha na Caixa Econômica Federal e já se casou com Valdenice, funcionária da Escola Novaerense. O casal nos deu dois netinhos, um menino de quatro e uma menina de dois anos.
A história continua e a trama da vida se faz, assim, de pequenos e simples acontecimentos.
Acho que o tal do Chevrolet Belair "rabo-de-peixe" nem existe mais...
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